A total ausência de responsabilidade e de escrúpulos nas decisões públicas não pára de me surpreender.
Ao fim de tanto pedido, aparentemente o encerramento total (e não faseado como defendido) da Biblioteca Nacional continua nas agendas.
Antes de mais, há que perceber que quem mendiga encarecidamente o seu não encerramento, não o faz porque quer ir ler um livro para passar o tempo.
Estão em causa teses, prazos perante entidades empregadoras, pesquisas e no extremo os próprios empregos (se não existir entrega dos artigos, não existirá remuneração).
Este assunto está a (tentar) ser discutido no Parlamento, mas a surdez é mais que muita.
A petição encontra-se online e um email circula. Passo-o a transcrever.
Neste explica:
- o porquê da urgência de manter as portas abertas;
- como tal situação pode ser coordenada;
- como pode ser mantida a segurança;
- o local onde instalar provisóriamente os investigadores e as obras;
- o facto de as obras públicas NUNCA respeitarem prazos.
Basta existir boa vontade e o sentimento de "querer".
Se a 30 Junho, às 17:20 conseguiram disponibilizar em DR a alteração do IVA para entrar em vigor a 1 de Julho, porque razão não é possível uma acção coordenada de esforço humano?
Acredito que a Ministra da Cultura será sensível a esta situação que passou ao lado dos seus assessores.
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"Todos entendemos que estas obras na BN são necessárias.
Está a ser ampliada a torre dos depósitos, construídas novas salas e serão feitas obras importantes de remodelação na torre antiga, nos depósitos antigos, digamos assim.
Por exemplo, vão mudar toda a parte eléctrica e terão que partir a coluna do edifício, rebentar paredes para instalar cablagens, etc.
Sabemos que a Biblioteca Nacional não tem um depósito exterior, como por exemplo a British Library, para onde pudessem ser enviados os livros que estão na dita torre e que terão que ser retirados.
Esta última obra implicará, por isso, a transferência dos livros da torre para a sala de leitura geral, onde ficarão armazenados até a intervenção estar concluída.
Contudo, uma Biblioteca Nacional presta um serviço público e não pode fechar totalmente a principal sala e os seus depósitos, ou seja mais de 3.000.000 de livros, durante cerca de 10 meses. Para além disso, nada nos garante que o fecho não se possa prolongar.
Segundo um funcionário que está na BN há muitos anos cerca de 40% dos tais 3.000.000 de livros não existem noutras bibliotecas de Lisboa.
Uma parte não existe em mais biblioteca nenhuma do país. Ou seja, não se podem sequer consultar na Biblioteca da Universidade de Coimbra, ou
na Biblioteca Pública do Porto ou de Évora.
O mais difícil será com as obras anteriores ao depósito legal (que salvo erro foi criado em 1918, durante o Sidonismo) e com os periódicos anteriores a 1910-1920. Quem trabalha séculos XVIII e XIX será bastante afectado. Mesmo quem trabalha períodos anteriores vai ter muitos problemas pois há inúmeras obras dos séculos XVI e XVII que estão no fundo da sala de leitura geral e não nos reservados.
A investigação não pode parar durante 10 meses. Há compromissos, teses, projectos e prazos a cumprir.
Sabendo que há pisos que tem mais pedidos (salvo erro o 3.º, 4.º e 5.º) e pisos com menos leitores, a obra e o encerramento deveriam ser faseados. O período de fecho destes pisos com mais leitores também deveria ser por um período menor que os 10 meses anunciados.
Há maneiras de resolver a situação.
A BN podia restringir a consulta durante um certo período, autorizando apenas investigadores com teses em andamento ou projectos de investigação em execução, ampliando ao mesmo tempo os prazos de resposta aos pedidos destes leitores. Por exemplo, passaríamos a ter que esperar mais tempo pelos livros e a instituição, para controlar e restringir o acesso, podia exigir um documento das universidades ou dos orientadores sustentando a necessidade da consulta. Mas ao mesmo tempo haveria a garantia de que quem de facto precisasse das obras nunca ficaria privado da sua consulta.
A BN tem espaços onde podia instalar uma pequena sala de leitura. Por exemplo, podia-se improvisar uma sala de leitura na antiga sala onde até há 2 anos funcionaram os periódicos. Este espaço está agora fechado e não tem qualquer uso.
É uma questão de bom senso."